O conceito recorrente do comum se elabora sobre a ideia de que em nosso mundo atual a produção da riqueza e a vida social dependem em grande medida da comunicação, da cooperação, dos afetos e da criatividade coletiva (Negri e Hardt). O comum compreenderia então os ambientes de recursos compartilhados que são gerados pela participação de muitos e que constituem o tecido produtivo essencial da metrópole contemporânea. Se fazemos esta conexão entre o comum e a produção, temos que pensar na economia política, no poder, nos rendimentos e nos conflitos. No entanto, devido a nossa tradição de separação entre o privado e o público, da propriedade e do individualismo, a propriedade coletiva é todavia difícil de se ver para nossos olhos do final do século XX. Propomos, portanto, uma busca do comum, uma busca que tomará a forma de um processo de mapeamento.
Entendemos a cartografia segundo a proposta por Deleuze e Guattari, usada por artistas e ativistas sociais durante a última década: como uma atuação que pode se converter em uma reflexão, uma obra de arte, uma ação social.O Brasil, como América Latina toda, é um país especial nas práticas dos commons. O comum bebe de tradições ibéricas (faixanais, rossios, propiedades comunais), da cultura afro (quilombos, criação cultural coletiva, propiedades conjuntas) e indigenas (propiedade coletiva, malokas). Do mutirão ao conceito de ‘comunidade’ que substitue a palavra ‘favela’, o Brasil é uma celeiro de práticas do comum. Porém, o mercado e o capitalismo estão castigando o comum sem piedade.
Porém, nos últimos anos, algumas mudanças importantes estão transformando a cidade. A publicidade – os out doors do neoliberalismo selvagem – foram proibidos no ano 2006. Encontramos novas experiências de produção cultural coletiva (saraus da zona sul), na gestão comum de espaços (hortos comunitários, parque da Nascente, Parque Augusta) ou nas mais de quarenta ocupações urbanas. Além, depois da recente e viva onda de protestos, a cidade entrou na onda das cidades rebeldes das que fala David Harvey. Os protestos, as intervenções urbanas, diferentes tipos de assembleias populares, apontam para a mobilidade urbana como um bem comum e reivindicam com força o direito à cidade. Apontam para um novo espaço comum, para uma nova interfaz participativa de convivência e gestão dos bens comuns, para um direito à cidade poscapitalista. O imaginário urbano de São Paulo, a urbe onde nasceu a tese da antropofagia social do Brasil, está mudando: tem mais a ver com bairros conectados, resilientes, tecidos ao redor do comum.
Oficina
Parametros
Mapa
LEGENDA DE ICONES (EM CONSTRUÇAO):
ICONE | SIGNIFICADO |
Mobilidad – cicloativismo | |
Pixo | |
Morar – ocupacoes | |
Commons digitais – hacklabs | |
Parques – parques | |
Agua |
Temas mapeados:
Morar
Cidades não são somente construções ou vazios, um aglomerado de pessoas em lugares. São organismos vivos, ativados pelos conflitos nela gerados, como no caso específico das ocupações de prédios vazios em São paulo e da população em situação de rua. Se por um lado temos as pessoas com a necessidade de morar de outro temos a propriedade privada, a especulação imobiliária e poder público, este ocupa um papel dúbio, ora como mediador entre as partes ora como gerador do conflito.
A ação de ocupar um lugar vazio é a ação que transforma lugares fixos e imutáveis em espaços praticados, afetivos, um espaço de mediação, de mobilização, resultado e gerador de articulações de movimentos sociais.
Se a cidade só é ativada só esta viva pela ação das pessoas não faz sentido deixar um edifício ou lugar desocupado.
As ocupações, os movimentos, colocam em xeque as formas tradicionais de morar, o sentido de propriedade privada, a maneira com a qual os espaços são construídos. Pela ocupação ser fruto da necessidade, ela cria moradias de maneiras muito mais autenticas às reais necessidades relacionadas ao morar.
Arte Multidutidinária
Arte Multidutidinária, um conceito em processo. Uma Arte Multitudinária seria uma arte que:
– cria conexões e insere as pessoas nos processos de criação;
– é produzida ou circula em rede;
– é de conteúdo livre;
– seja produzida de forma autônoma, desvinculada do Estado/Capital e das instituições tradicionais de arte;
– estimula a liberdade de pensamento;
– está envolvida com a ideia da criação em uma nova forma de vida, ou seja, novas formas de circulação, produção e relação entre a arte e a vida;
– se utiliza de múltiplas linguagens e mídias;
– é uma arte politica (politica aqui não apenas no seu sentido panfletário ou ativista, mas a partir da ideia de a politica está presente em todas as nossas ações);
– está engajada com seu tempo, e as lutas de nossa sua época;
– promova encontros e debates em torno das obras/produções artísticas, mas que ultrapasse os limites do campo específico da arte.
– é uma arte que estimula o afeto, a criatividade e a sensibilidade.
Pixo
A constituição da pixação paulistana como um commoning, se da pela sua potência conflitiva de desafiar e questionar os limites do público e do privado. Esse desfio acontece tanto pela ocupação de superfícies, princip urbanas, como de instituições de ensino, artísticas e monumentos públcos.
A pixação é uma organização social complexa, que detém um saber revelar a falibilidade dos sistemas de segurança e controle que incidem no meio urbano. É uma tecnologia de subversão, aprendida pela prática e partilhada por todos nas conversas dos points (pontos de encontro dos pixadores), onde revelam suas proezas para seus iguais. É um sistema de comunicação autônomo que satura a rede com a exposição de uma marca. E a criação do público, que interage com a obra no reconhecimento de seus autores, e os retira da invisibilidade que vivenciam cotidianamente.
“Não é a pixação uma forma de resistência (de re/existência) ao poder como pensam os marxistas e militantes da esquerda tradicional. Ela é uma micropolítica do cotidiano, uma fenda existencial, uma disputa decalcada na lógica das subjetivações. A pixação é uma ginástica política e ética.” (trecho do livro – O Sujeito Pixador – Daniel Mitman).
Buraco da Minhoca
Artistas, pessoas em situação de rua, ciclistas, produtores culturais, coletivos artísticos, movimentos sociais, transeuntes da Rua Augusta e da praça Roosevelt
Parque Augusta
A partir de novembro de 2013, para pressionar o prefeito a sancionar o projeto de lei que daria aval a criação do Parque Augusta, a movimentação da população pela criação do Parque Augusta se intensificou a ponto de alcançar a meta e ter o documento assinado pelo prefeito no dia 23 de dezembro.
Com esse objetivo atingido o movimento se voltou a elaboração do projeto de autogestão do parque. Porém, o arbitrário fechamento dos portões na virada do ano pelos ainda proprietários do terreno, fez o movimento ter que se estruturar sem ter o parque como base para os encontros, foi criado então, como estratégia de articulação e comunicação, o Organismo Parque Augusta (OPA).
As ações imediatas do OPA tem sido no intuito de pressionar o poder público a não ceder ao interesse do capital privado em detrimento do bem comum, a natureza.
A luta pelo parque é um símbolo que evidencia o descaso ambiental e a problemática do abuso do direito de propriedade presentes na especulação imobiliária nos grandes centros urbanos e causadores de gentrificação (http://reporterbrasil.org.br/gentrificacao).
Para interferir a favor de uma forma de viver e perceber na cidade de São Paulo, o grupo propõe a construção colaborativa de tecnologias e metodologias autônomas de organização em rede, autônomas.
A partir de experiências diretas de organização, da troca de repertórios e da busca por referências, métodos de autogestão estão sendo experienciados em diversas frentes de atuação. A essência da relação que ocorre entre as pessoas do movimento: emancipação: simultaneidade entre aprender e ensinar.
Casa Amarela
O Ateliê Compartilhado Casa Amarela, ao mesmo tempo que oferece um espaço para criação, produção artística e difusão da arte de coletivos no centro de São Paulo, também reforça a arte enquanto veículo de resistência ao sistema e de diálogo direto entre os artistas e as pessoas que vivem e vivencia a cidade.
quais os atores envolvidos.
Movimento de Ocupação de Espaços Ociosos, coletivos artísticos, cooperativas e entidades de classe artísticas; grupos e artistas individuais de todas as linguagens e vertentes; poder público; polícia federal quais os conflitos.
Apropriação de um imóvel público abandonado que está sendo negociado entre INSS (atual proprietário) e prefeitura de São Paulo. Conflito interno na prefeitura entre secretarias de Direitos Humanos e Cultura. Processo de reintegração de posse em curso. Disputa do local entre os artistas e movimentos de moradia. Problemas internos da ocupação quanto ao uso do espaço e códigos de conduta entre os ocupantes.
Pracas
O comum ‘Ocupraças’ tem como princípio mapear ações de coletivos que propõem a ocupação e uso de praças, que são um espaço público, tornando-as de uso comum.
Essas ações mostram que é possível se apropriar dos espaços possibilitando a interação, convivência e troca entre pessoas, mesmo numa cidade hostil como São Paulo.
É também uma forma de validar a importância e consolidar as áreas verdes ainda existentes na cidade.
A iniciativa parte de coletivos (*serão identificados no mapa) com apoio de associações e moradores que promovem encontros e eventos como festivais de música, karaokê, pic nic, sarau, aulas e debates, hortas coletivas e oficinas.
Conflitos: Falta de infraestrutura básica como banheiros, lixeiras e coleta de resíduos;
Falta de apoio e incentivo do poder público, que muitas vezes não realiza ao menos a manutenção básica destas áreas; Divergência de opinião de alguns moradores que não partilham da ideia de uso comum do espaço, argumentando que estes eventos podem trazer barulho, sujeira e atrair moradores em situação de rua.
Mobilidade urbana
A questão da mobilidade urbana em São Paulo, e até no Brasil, pode ser compreendida, de maneira geral, a partir do processo de planejamento urbano que vem sendo produzido e reproduzido ao longo do tempo. É um planejamento essencialmente pautado no carro como principal meio de transporte. Ou seja, toda a estrutura construída para o deslocamento das pessoas e o desenvolvimento da cidade é feito a partir do carro.
Esse modelo já se mostrou fracassado há muito tempo pq a cidade já está saturada. A estrutura não suporta mais a quantidade de carros que circulam. Paralelamente a isso, o Estado, que é quem determina o fluxo do transporte coletivo e cobra por isso, não investe na melhoria desse sistema nem oferece políticas públicas para que se desenvolvam transportes alternativos. Muito disso ocorre pela influência do capital automobilístico, que tanto regula a economia, como financia o próprio Estado através campanhas eleitorais. Fazendo com que esse ciclo vicioso, do carro como principal meio de transporte, seja contínuo.
A partir disso, a gente consegue extrair e mapear movimentos sociais e coletivos que vêm atuando para romper esse paradigma. Dentro desse contexto, os comuns escolhidos para o mapeamento são :
– o cicloativismo;
– os transportes alternativos;
– o acesso à informação útil;
– e o transporte gratuito.
Os atores envolvidos são, em sua maioria, projetos desenvolvidos por
coletivos que lutam basicamente por: planejamento holístico dos meios de transportes, acessibilidade da informação aos usuários do transporte coletivo e gratuidade do transporte público.
O processo de atuação se dá a partir da apropriação dos espaços dos carros para protestos ciclísticos, criação de ambientes virtuais para debates e conscientização sobre meios de transportes alternativos e sustentáveis, e humanização das relações de mobilidade.
Lixo-residuo
Resíduos são possívelmente no contexto urbano posindustrial um dos maiores recursos que não estão sendo bem aproveitados. Com atual nivel de consumo nas nossas cidades, resíduos são fonte permanente de conflito social, ambiental e econômico. A questão da reciclagem é só a ponta do iceberg, nossos
Embora todos estamos envolvidos na produção e gestão de lixo, são uns poucos agentes os que transformam isso em recurso. Catadores de materiais recicláveis, cooperativas de catadores e empresas de gestão de resíduos e prefeituras são os principáis agentes envolvidos.
Como qualquer outro recurso, os resíduos são um bem fortemente disputado. Tradicionalmente, foram os catadores informais presentes nas cidades os que recolheram e venderam esses materiais. A tendência nas cidades occidentais foi a progressiva privatização da gestão e a aparição da reciclagem organizada por grandes grupos empresariáis trabalhando sob licença das prefeituras.
No Brasil, a nova lei federal de resíduos chega tarde e com um forte conflito ambiental em grandes e medianas cidades provocado pela grande quantidade de resíduos descartados e direitamente aterrados. O catador é agora reconhecido como ator fundamental nas novas políticas de gestão de resíduos, e nesse momento, a disputa pelo manejo dos materiais recicláveis envolve todos os atores: informais e oficiais, grandes e pequenos.
Resíduos geridos com conhecimento são mais uma fonte de recursos que pode ser aproveitada de forma eficiênte. Não só não podemos mais descartar nossos recursos como fazemos nesse momento, se além disso, identificamos e localizamos nossos resíduos e conhecemos novas formas de aproveitá-los, estaremos oferendo possibilidades de empoderamento tão abundantes quanto abundante é nosso lixo.
Commons digitais
Os commons digitais são especialmente importantes no ecossistema dos bens comuns urbanos. Por um lado, porque do funcionamento das redes (Internet, telefonia), depende o funcionamento do sistema todo. Por outro, porque a arquitetura aberta de uma rede pode influenciar em todos os outros comuns de uma sociedade
Quais os atores envolvidos?
Grupos, projetos que atuam em temáticas relacionadas a: cultura livre, acesso à educação, privacidade e dados digitais dos cidadãos, criptografía, Software Livre e segurança digital. Grupos que compartilham o mẽtodo de suas ações e praticam o código aberto. Por outro lado, hackers,cryptopunks, programadores, informáticos, asociações de software livre, instituições que usam e incentivan, software livre. Alguns atores conhecidos: Transparência Hacker, ACTANTES, cryptorave, Garoa Hacker Club, Pimenta Lab. CMI,Casa de Cultura Digital….
A propriedade intelectual restritiva, a ausência de privacidade, a vigilância, a mercantilização do conhecimento, a retenção de dados, os problemas da banda larga, ia ausencia de nclusao digital. Tambem formam parte do conflito o uso de ferramentas propietárias, uso de licenças fechadas, a coptação e apropiação de processos, o branding e comportamento de marca, o formato broadcast (emisor-recetor) das comunicações, a falta de apoio por parte das instituições, o lobby das empresas de sofware propietario e do mercado no geral.
A criação de redes, métodos e protocolos ao redor da tecnologia livre pode criar processos tecnopoliticos e empoderamento cidadão. A inclusao digital (espaços com WIFI, projectos de acceso tecnologico) e um espectro electromágnetico mais democrático sao condiçoes fundamentais para a nova sociedade rede.
Hortas urbanas
Em São Paulo as principais iniciativas e articulações para implantação de hortas urbanas se dá através do Coletivo Hortelões Urbanos – um grupo aberto no FB onde pessoas interessadas se conectam com voluntários e hortas já existentes criando assim uma rede autogerida.
São realizados encontros, mutirões e ações nas redes sociais para divulgação e adesão de voluntários para implantação nos espaços sugeridos.
Os atores são: moradores/voluntários, associações e comerciantes da região através de doações; Coletivo Hortelões Urbanos, Organização Cidades sem Fome, Projeto Escola Estufa.
O principal conflito em relação a implantação de hortas urbanas em espaço público é a falta de legislação vigente a respeito. Desta forma sempre surgem questionamentos dos moradores não envolvidos em relação ao manuseio e depósito de material orgânico; abertura de cacimbas (reservatório de água) e isolamento da área para animais de estimação/cachorros.
Workshop proposto por Pablo de Soto e facilitado em colaboracao com Natacha Rena, Bernardo Gutierrez e Felipe Brait.
Participantes: Juliana Jonson, Paula Gil Larruscahim, Pâmela Sarabia, Daniel Ferreira, Mahyra Mazzini, Orlando Coelho, Guilherme MMRC, Ana Banin, Chico Tchello, Ana Rosa Colhado, Brígida Campbell,Fernanda Grigolin, Kleyson Barbosa, Emannuel Costa, Letícia Liñeira, Margot Pavan, Henrique Parra, Breno Castro, Felipe Cabral, Ruth Klotzel, Mr Basurama.
Como parte do projeto MULTITUDE com curadoria de Lucas Bambozzi, Natacha Rena, Andrea Caruso.
(*) A Primeira Fase de Mapeando o Comum em SP aconteciou do 21 a 25 fevereiro No contexto de Encontro AVLab.
Foto encima: Fanpage Parque Augusta